7 de setembro de 2018
antimatéria
antes de tudo, escrevo.
do contrário, apenas rabiscaria
papéis em um escritório.
contaria cédulas e moedas em um banco.
ou trabalharia em uma repartição pública.
chegaria em casa às vinte horas,
faria a janta e assistiria à novela,
a um filme ou ao jogo de futebol.
depois, sem pensar em nada de mais,
sem chance para as lucubrações,
apenas esvaziaria da mente o longo dia,
números, contas, asfaltos, obrigações.
veria a cama,
que seria somente uma cama,
fecharia os olhos e dormiria.
no outro dia, calçaria os sapatos,
escovaria o cabelo, os dentes,
tomaria o café da manhã lendo o jornal,
que seria somente um jornal,
e voltaria ao local de trabalho,
talvez depois de brigar com o relógio,
talvez pontualmente.
viveria assim, burocraticamente.
e enchendo-me de cotidiano,
até o limite onde eu transbordaria,
haveria o risco de em mim
ainda caber um novo hábito:
entre o céu e a terra,
enxergar apenas o que é palpável.
(imagem: José Gurvich)
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O cotidiano, as regrinhas todas, a falta de sensibilidade, muitas vezes até com as nossas próprias vidas, tudo isso pode fazer mesmo com que uma pessoa acabe às vezes agindo como um robô, e enxergando "apenas o que é palpável". Esse texto parece que tá nos chamando pra uma tomada de consciência.
ResponderExcluirDigno de grande autoria.
ResponderExcluirDeus nos livre da mesmice. Fugir da monotonia, buscar o novo, mesmo que esse novo esteja apenas nas palavras.
ResponderExcluirUm abraço